domingo, 14 de novembro de 2010

Conto que tentei escrever - Lucas Ferreira Martins

Postado por Mariana às 14:23
          A vida – especialmente a vida humana, já que a grande maioria das outras espécies leva em suas cadeias evolutivas algumas dezenas de milhares de anos a mais – é um saco. A vida é um saco. Pra falar a verdade, é impossível gostar da vida. Talvez seja possível suportá-la ou até mesmo ignorá-la, mas gostar mesmo é impossível. A vida nunca é do jeito que a gente quer. Entretanto, há exceções. Tais exceções referem-se basicamente ao fato de que uma vida pode estar junto da outra, compartilhando suas qualidades e defeitos, seus problemas e suas devidas soluções: alguns chamam de amizade – melhor sentimento do mundo –; já outros chamam isso tudo – sensações, sentimentos e emoções que nos fazem gostar da vida e até nos divertir um pouco – de amor.
Numa certa quinta-feira, estava eu numa estação de trem na bela cidade de Londres, quando me veio à cabeça uma ideia um tanto comum, devido ao ócio resumidamente imenso das estações em Londres. Se houvesse algo a se fazer ali, certamente seria olhar para o movimento frenético das pessoas, que, em seu stress cotidiano, viviam preocupadas com a Vida, o Universo e Tudo o Mais. Ou então eu poderia fazer palavras cruzadas, enquanto saborearia um café e alguns biscoitos. Escolhi claro, a segunda opção. Optei pelas palavras cruzadas do The Guardian. Elas me desafiavam, os criadores de tal jogo sempre queriam estar entre os espertinhos. Café: expresso. E biscoitos amanteigados. Sentei-me e comecei a fazer as palavras cruzadas.
De repente, ela sentou-se na cadeira à minha frente, e não disse uma só palavra. Eu abaixei o meu jornal, reclinando-o sobre a mesa. Ela era estranhamente fria. Não fria como um cubo de gelo, mas fria como uma parede. Ela também era incrivelmente linda. E sua face não expressava nenhum sentimento, nem emoção; tamanha eram sua impessoalidade e frieza naquele instante. Mas sim, ela era terrivelmente linda. Eu simplesmente a ignorei – a via como qualquer londrina, afinal, havia centenas de mulheres naquela estação de trem –, e peguei um dos meus biscoitos. Furtivamente e para a minha surpresa, ela também pegou um dos biscoitos. Não podia mais ignorá-la. Ela me propunha um duelo. Eu, então, fiz o que qualquer inglês viril faria: peguei outro biscoito. Ela me respondeu com o mesmo gesto. Ela não parecia nada preocupada com a minha virilidade, enquanto eu já estava ficando histérico. Bem, histérico dentro da habitual fleuma britânica.
Eu pegava um biscoito, ela outro...
Então, depois de longos minutos – considerando, claro, a relatividade do tempo diante de situações tensas; e o fato da caixa ter somente oito biscoitos amanteigados - a caixa acabou, e ela foi embora. Quando eu reergui meu jornal para recomeçar as palavras cruzadas, desmaiei. Acordei um segundo depois. Debaixo do jornal, estavam os meus biscoitos. Não sei por que ela fez isso. Ela era linda e havia naquele instante me deixado intrigado. Para mim, isso já bastava.

Como eu ia dizendo, a vida nunca é do jeito que a gente quer. Mas, se eu não tivesse um final feliz em mente, eu não teria começado a contar essa história maluca. Então, a partir de agora, começa uma linda história de amor. Um amor puro e sincero, como dificilmente o é.

            Corri atrás dela durante alguns segundos, tentando alcançá-la. Consegui. A primeira pergunta que passou pela minha cabeça foi:
- Porque você fez aquilo?
            - Apenas pra ver sua reação diante de situações, digamos, embaraçosas. E claro, rir.
            Depois sentamos, conversamos, rimos um do outro, e embarcamos num papo sobre o temperamento dos ingleses e outras coisas que surgiram de repente. Ela tocava bateria numa banda de rock e estava indo para um ensaio no centro da cidade. Eu estava de bobeira, daí ela me convidou. Fui. Bom, sobre ela: quando ela disse seu nome, eu entendi algo muito parecido com “anestesia”. Linda, cabelos encaracolados castanho-claros, olhos escuros e misteriosos, branca e um pouco mais baixa do que eu. E o sorriso mais bonito que eu já vi na vida. Quanto à roupa: estilo inconfundível de rock – muito preto e roxo. Já eu: não me considerava exatamente um deus grego. Pra falar a verdade, minha auto-estima mal dava pra levantar da cama de manhã. Não era forte, eu era mais pro tipo magro alto. Cabelos curtos, pretos. E era branco como uma folha de papel. Eu tinha grandes olhos castanho-claros. Acho que meus olhos já expressavam tudo o que se passava na minha cabeça sem precisar das outras partes do corpo. Eu já havia sido guitarrista em uma banda de jazz, mas atualmente trabalhava na rádio local, e meus amigos diziam que eu tinha um ótimo emprego – a maioria deles trabalhava na área de publicidade – e não havia razão para reclamar tanto dele.
Havíamos chegado ao local do ensaio e fui recepcionado pelo pessoal da banda: um baixista – que era incrivelmente parecido comigo –, uma guitarrista extremamente simpática com os cabelos vermelhos, e a vocalista que veio logo puxar assunto comigo.
            - Quer dizer que você é guitarrista?
            É claro que eu queria entrar naquela banda. Mas não convinha dizer que eu tocava muito, havia um bom tempo que eu não pegava na minha guitarra.
            - Já toquei durante algum tempo em uma banda de jazz. Atualmente tô meio inativo.
            - Jazz... Legal. Há algum tempo queria fazer umas músicas com uma harmonia mais complexa, e quem sabe com algum improviso. De repente, você podia ficar vindo pra cá, nos dar uma força.
            - Pode ser, mas antes, quero ouvir o som de vocês!
            Falei sem pensar muito, o que eu queria mesmo era ver a Anasthasia tocar. O Marcelo – meu sósia – ainda estava afinando o baixo enquanto a Camille ajustava seus pedais. A Daniela que equalizava tudo gritou:
            - Vamos lá, pessoal!
            Camille surgiu de não-sei-aonde e pegou sua guitarra. Anasthasia deu três toques e começou o Rock N’ Roll. Quando Daniela começou a cantar, eu já estava apaixonado pela banda – principalmente pela baterista –. Todos tocavam muito bem, porém ela me atraía de um jeito especial. Acho que era o seu sorriso, a alegria que ela passava. Não era a mesma pessoa que eu havia conhecido na estação de trem. Quando a música acabou, eu elogiei a banda e disse que era só combinar o horário do próximo ensaio e eu apareceria, trazendo minha guitarra e minha disposição. Anasthasia me agradeceu com um abraço incrível e um beijo no rosto. Após isso, ela me deu seu telefone, endereço, e eu fui embora.
            Uma coisa desse tipo não acontece todos os dias. Confesso que me surpreendi com a minha própria sorte. Finalmente as coisas estavam dando certo na minha vida. Um amor, uma ocupação nova, novos amigos, e isso tudo em apenas um dia. No caminho pra casa, fui assaltado. Mas não importava, era apenas um celular. Dentro de mim, estava contentíssimo.
            No mesmo dia, passei na loja de instrumentos e comprei cordas novas para a minha guitarra. Chegando a casa fui direto pro quarto, onde limpei a guitarra, troquei as cordas velhas, tirei o excesso de poeira da minha caixa amplificada e fui tocar. Depois de aproximadamente duas horas, estava exausto e fui dormir. Antes de dormir, eu tinha quase sempre que fazer as mesmas coisas. Era como um, digamos, ritual. Desci as escadas, todos os quinze degraus, cheguei ao banheiro, lavei as mãos, usei a privada, percebi que tinha feito tudo – de novo – na ordem errada, tive que lavar as mãos de novo; escovei os dentes, saí do banheiro, subi as escadas, entrei no quarto, troquei de roupa, deitei na cama e li durante uns quinze minutos. Os primeiros dez minutos foram gastos tentando achar a página em que eu havia lido na noite anterior. Os outros cinco minutos, eu não lembro: acho que peguei no sono. Fiquei virado para o lado direito durante aproximadamente duas horas, depois cocei levemente o nariz e virei para o lado esquerdo, onde passei os outros quarenta e cinco minutos. Depois virei novamente para o lado direito, e passei a noite toda assim: dormindo.
Camille e Anasthasia
No dia seguinte, a única coisa que passava pela minha cabeça era o fato de a vida – a partir do instante em que eu conheci Anasthasia – estar maravilhosa. Eu estava empolgadíssimo com a ideia de tocar numa banda de rock. Eu tinha vinte e seis anos e até então nunca havia experimentado uma sensação tão boa assim. O amor deixa a gente um pouco mais leve. O amor desperta em nós alguns sonhos antigos que já haviam sumido. Aparecem também novos sonhos, novos motivos pra viver. Resolvi chamar a Anasthasia pra sair, e para a minha surpresa, ela topou. Aproximadamente seis horas depois, estávamos tomando sorvete e apreciando uma bela paisagem de outono em um parque onde as criancinhas brincavam, os adolescentes riam, e os jovens tomavam sorvete e apreciavam uma bela paisagem de outono. O fato é que estava acontecendo alguma coisa entre a gente. Conversamos sobre infância, adolescência, juventude, e de repente – do mesmo jeito que ela entrou na minha vida naquela estação de trem –, ela disse o que pensava sobre o amor, e era exatamente a mesma coisa que eu pensava. O mesmo amor que nunca acaba e que tudo suporta! O amor que tudo crê e que tudo espera! Nós não podíamos – nem queríamos – impedir, e aí aconteceu: nós nos beijamos e nos esquecemos de tudo o que havia a nossa volta.


O próximo ensaio seria no domingo à noite. E eu era, naquele instante, o cara mais feliz do mundo. De noitinha, saí com meus amigos do trabalho, mas, não consegui prestar a menos atenção no que eles estavam falando. Eles nem notaram isso... Eu nem queria saber, sai à francesa da pizzaria e fui pra casa. No caminho, eu cantarolava umas músicas alegres e sorria sem nenhum motivo aparente. Queria vê-la de novo. Queria que tudo acontecesse de novo. Cheguei a casa, tomei banho, troquei a roupa, e fui estudar minha música, minha guitarra. Minha técnica estava quase tão apurada quanto antes já estivera. Aos poucos eu recuperava a velha sonoridade jazzística. Fui dormir.
Já era hora do ensaio e o nervosismo tomava conta do meu interior. Não sabia dizer ao certo qual seria a reação das pessoas sobre eu e Anasthasia estarmos namorando. No final das contas, todos me cumprimentaram normalmente. Confesso que isso me deixou bem mais tranqüilo. Para a minha felicidade, eu já fazia parte do grupo! Tocamos no início do ensaio uma seqüência de improvisos. Depois, a Camille veio me ensinar uns arranjos das músicas próprias da banda. Depois do ensaio, nós fomos a um pequeno pub perto do estúdio, onde rimos da incrível semelhança entre eu e o baixista. Ele era magro como eu, mesma altura, mesmo tipo de cabelo. O Marcelo aprendera a tocar baixo com o pai, um típico fã dos Beatles. Já a técnica da nossa guitarrista ruiva - Camille - era praticamente insuperável. Eu não sabia exatamente o que ela estava fazendo numa pequena banda do centro de Londres. Era como Picasso querendo caiar uma cerquinha de madeira. Confesso que eu ficava meio sem-jeito quando ela entrava solando. Anasthasia estava a cada dia se superando e todos viam isto. Já eu, estava cada dia mais apaixonado por ela. E ela por mim. Tudo estava dando certo. Agradecia a Deus todo dia por tudo que ele havia feito em minha vida naqueles últimos dias. A Daniela havia marcado na quarta-feira seguinte uma apresentação em uma praça perto de onde nós estávamos. No dia seguinte, logo após o trabalho, decidi comprar umas coisinhas que todo guitarrista precisa: pedais. Antes, claro, pedi uma ajudinha a Camille sobre quais tipos de pedais eu me adequaria melhor.
Ok... No dia da nossa apresentação, tudo já estava pronto. Músicas ensaiadas. Pedais ajustados. Minha autoconfiança já estava de volta. Amigos de verdade no mesmo palco que eu. Chegava a hora de finalmente aumentar o volume da minha guitarra e tocar. Já tinha pelo menos umas mil pessoas naquela praça e nós estávamos animadíssimos. Um cara forte com uma voz de locutor de rádio que já estava animando a galera - há algum tempo - tinha acabado de anunciar nossa banda e nós fomos entrando no palco. Começamos com alguns minutos de improviso enquanto a Daniela dava uma aquecida na voz – ela ainda não havia subido ao palco –. Notei logo a diferença de um público jazzístico e um público rockeiro. As pessoas daquela praça estavam delirando com o nosso som. E foi aí que eu olhei para a Anasthasia. Como havíamos ensaiado; instantaneamente ela parou de tocar. Era à hora de a nossa vocalista entrar e o povo gritou ainda mais. O Marcelo tocou uns riffs no baixo e a Dani começou a cantar. Olhei de novo para o amor da minha vida e ela me respondeu com um sorriso maravilhoso. Eu tocava pra ela. Eu havia entrado naquela banda por ela. Bem, depois de certo tempo, eu larguei meu emprego na rádio e fiquei me dedicando a banda, que estava crescendo e ganhando fãs. A Daniela havia sido reconhecida na rua e tudo o mais. Toda a banda estava muito feliz. Eu principalmente. No dia em que eu for me casar com a Anasthasia, prometo que chamo vocês. Acho que eu não disse o nome da banda. Era Rock N’ Love

PS: Eu quero ser madrinha viu?
PS2: Morro de saudades de vocês.
PS3: Faltou eu no texto.

2 comentários:

Lucas Martins disse...

lindo... quem foi o grande genio criador?

:D

saudades suas também... jéssika antas deve morrer de raiva por ela nem aparecer um tiquinho no texto...
entra na fila da "madrinhagem"!

beijos mils '

Mariana disse...

Ei fila nada viu seu moço? kkkk

Postar um comentário

Achou o quê? Me conta?

 

Mariana Diniz Template by Ipietoon Blogger Template | Gadget Review